Carta 4 - Para meu irmão.

"Pastelaria, boa tarde."

Você tem 20 anos já, seu besta. Isso não é jeito de se atender telefone.

Eu tava falando pra mãe ontem, que crescer dói e eu percebo que você quer evitar essa dor. Não evite, irmão. A gente precisa entender e parar de culpar os outros pelas coisas, é libertador quando assumimos nossos defeitos e erros e a responsabilidade das situações.

Irmão, preciso te falar de outra coisa que me incomoda muito: para de mentir sobre você. Eventualmente as pessoas vão descobrir que você não é um super cozinheiro e que na verdade mal sabe fritar um ovo, que você não fala outra lingua além do português, que você não é culto como gostaria e que não é massoterapeuta e que ficou uma semana só na aula de judô. E para de inventar apelidos para si mesmo, é feio e meio perturbante.

Você precisa trazer pra realidade essa pessoa que você imagina ser, lutar para que ela se torne real, entende? E pare de culpar a mamãe, assuma o controle da sua vida.

Espero que agora que estaremos por perto novamente, eu possa te ajudar em alguma coisa e te dar bons conselhos e que você amadureça.

E mais uma coisa: você tem sorte de ser o irmão mais novo, mamãe gastou comigo toda a inexperiência e o blábláblá de projeção e tudo o mais. Larga mão de ser tonto e aproveite.

Te amo, seu imbecil.

Afeto,

Rachel.

Edição:
Olha irmão, eu reli a carta e esqueci de falar umas coisas muito importantes. A primeira é que eu quero que você pare de se machucar com a história sua e do seu pai e não me odeie por ter convivido mais com ele do que você. Ele era uma ótima pessoa, te amava , mas não sabia ser pai. Nem meu, nem seu e nem dos seus irmãos. E ele não te abandonou, ele SE abandonou. Ele não sabia ser pai, frisa isso ai.

Outra coisa, eu preciso que você me prometa que nós não seremos como a mãe e o tio, que seremos dois velhos chatos que vão passear de tarde na praia, xingando a molecada que fala alto demais.

Pronto, era isso.